14 músicas escritas sobre estrelas da antiga Hollywood

É impossível não pensar em Bette Davis Eyes da Kim Carnes quando se fala de músicas escritas sobre estrelas da antiga Hollywood. A canção, lançada em em 1981, foi um sucesso tão estrondoso que a própria Bette ficou muito feliz. Kim ganhou um disco de Ouro e outro disco de Platina pela canção e fez questão de mandar para Bette uma cópia de cada um, que ela pendurou em sua casa. 


Capa do EP de Bette Davis Eyes sobre a Bette, escrita por Kim Carnes                   Divulgação
Outra música que temos em mente quando pensamos em estrelas da antiga Hollywood é Candle in The Wind do Elton John, que não é sobre a princesa Diana e sim sobre Marilyn Monroe, mas que foi reescrita parcialmente para servir como homenagem para Diana, com Candle in The Wind sendo tocada por Elton no funeral da princesa em 1997. 

A fascinação com as estrelas de Hollywood, especialmente as da Old Hollywood, continuam depois de décadas e a aparência glamourosa e misteriosa dos astros ajuda e muito na hora de fazer uma música de sucesso. Vem conferir na A Listinha, 14 músicas escritas sobre estrelas da antiga Hollywood e faça da sua playlist um sucesso! 

Paul Newman's Eyes - Dogs Die in Hot Cars

A banda escocesa Dogs Die in Hot Cars lançou uma música em homenagem ao Paul Newman, ou melhor aos olhos dele, no seu disco Please Describe Yourself lançado em 2004. A canção foi escrita pelo vocalista Craig Macintosh e no site oficial da banda, ele explica como pensou no tema da música: 
Paul Newman's Eyes veio para nós bem fácil. Eu acho que todo mundo gostou do ritmo clean, das mudanças de tons [...] O tema da letra é bem direto: o que queremos, desejos, o que temos, o que nossos vizinhos tem, como temos sorte de não sermos vítimas como outras pessoas. [...]
O álbum Please Describe Yourself também tem outra música baseada, em parte no Paul Newman, a Modern Woman, no qual eles também falam sobre Steve McQueen (os dois, como sabemos não se davam nada bem.) Mas a letra de música do Paul Newman's Eyes é com certeza uma ode à beleza do astro, afinal não seria nada mal ter os olhos dele. 

Errol - Australian Crawl


A banda australiana de rock, Australian Crawl é uma das mais famosas do país e lançou seu segundo álbum Sirocco em 1981. O disco continha a música Errol, uma homenagem ao ator Errol Flynn, escrita por James Reyne, vocalista da banda e Guy McDonough, o guitarrista, quem cantou a música.  Guy morreu não muito tempo depois, em 1984. 

A ideia da canção é ser uma mini-biografia sobre Errol Flynn, como James contou em uma entrevista para o jornal The Sidney Morning Herald em 2015
Eu tinha visto alguns filmes dele e isso me fez vê-lo em uma luz diferente. Então eu li mais sobre sua vida depois disso e sobre suas experiências em Cuba como jornalista. Ele foi um dos primeiros caras à ir para a floresta encontrar Castro quando Castro era apenas um líder rebelde. Todas as coisas que ele fez além de sua carreira no cinema. 
James não parou por aí e também afirmou que Errol "levou uma vida extraordinária." A canção do Australian Crawl certamente mostra esse sentimento e com um ritmo bem gostoso, duvidamos que o refrão vai sair da sua cabeça. 

Take Take Take - White Stripes sobre Rita Hayworth

O vocalista da banda The White Stripes, Jack White, era obcecado pela atriz Rita Hayworth (e também quem não seria, certo?) Para o álbum da sua banda, o Get Behind Me Satan, lançado em 2005, ela colocou não uma, mas duas músicas inspiradas em Rita Hayworth, o "White Moon" e o "Take Take Take", mencionado acima. 

Em entrevista para a revista Rolling Stones em 2005, ele afirmou que se identificava, em partes, com a atriz:
Rita Hayworth se tornou uma metáfora sobre tudo o que eu estava pensando ao fazer o álbum. Existe um autógrafo dela - ela beijou um papel, deixou uma marca de batom nele e escreveu 'Meu coração está na minha boca.' Eu amo essa frase e me pergunto por que ela escreveu. Também tem o fato de ela ser latina e ter mudado seu nome. Ela se tornou algo diferente, se transformou e tentou colocar algo para trás. 
O autógrafo do qual ele se refere seria este aqui, mas não temos certeza da veracidade da autoria:





Para se ter uma ideia Jack White é tão fã de Rita, que tem um perfil só dela aqui na Caixa, que nomeou uma de suas guitarras com seu nome: as outras três se chamam Veronica, em homenagem à Veronica Lake, e Claudette, em homenagem à Claudette Colbert. 


La beauté d'Ava Gardner - Alain Souchon

Ava Gardner ficou conhecida pela alcunha de "O animal mais belo do mundo" e também pudera,  a atriz tinha uma beleza de parar o trânsito. O cantor francês Alain Souchon escrevey a canção La beauté d'Ava Gardner, ou seja, a beleza de Ava Gardner, em 1989 para o seu álbum Ultra Modern Solitude. A música foi lançada como B-Side primeiro, mas com o sucesso estrondoso ele logo a lançou como um single.

Na letra, ele fala sobre a nostalgia de tempos melhores sabendo que nada na vida realmente dura, nem a beleza de Ava. Um tributo para a atriz da antiga Hollywood, Alain colocou até um foto da Ava na capa do EP. 


Uma canção linda, La beauté d'Ava Gardner é uma ode super merecida para a atriz, que tinha uma voz de canto maravilhosa

Dorothy Dandridge Eyes - Janelle Monae feat Esperanza Spalding

Dorothy Dandridge é uma das atrizes negras mais importantes do cinema mundial, por ser a primeira a conseguir uma indicação ao Oscar como Melhor Atriz pelo seu papel em Carmen Jones (idem, 1954). 

A cantora e atriz Janelle Monaé, que também é negra, reconheceu a importância de Dorothy em seu álbum The Eletric Lady, lançado em 2013. Segundo o encarte interno do álbum, a canção foi inspirado na cena de Carmen Jones, na qual a personagem e Joe, vivido por Harry Belafonte, ficam com o jeep estagnado na água. 

Em entrevista para o programa de TV, Arsenio Hall, em 2013, ela revelo um pouco mais sobre sua motivação em escrever Dorothy Dandridge Eyes:
Nós só queríamos homenagear Dorothy Dandridge. Ela não só era linda, como também uma ativista. Ela realmente abriu várias portas para as mulheres negras. 
Fred Astaire - Donna Summer

Donna Summer foi uma cantora norte-americana super consagrada, com hits como Hot Stuff e I Feel the Love e, também uma apreciadora da antiga Hollywood. Em 1991, para seu álbum Mistaken Identity, ela lançou a música Fred Astaire, em homenagem ao ator e dançarino. 

Na letra, ela fala sobre o mundo da dança e pede que seu amado seja seu "Fred Astaire." No kit de publicidade de seu álbum, ela contou mais sobre o significado da música:
Fred Astaire é uma música para sair com a galera e para a festa. Todo mundo está saindo e procurando a pessoa certa, aquele que vai dançar melhor com você. 
Quem dera encontrar um parceiro(a) que dança como Fred Astaire, certo?

James Dean - Eagles

James Dean é um dos atores mais polêmicos e amados no mundo do cinema. Ele fez apenas três filmes antes de morrer em um acidente de carro, mas foi o suficiente para que ele tivesse seu lugar marcado, como lenda, para sempre.

Inúmeras músicas foram feitas sobre o ator, mas a James Dean do Eagles consegue capturar a essência do Rebelde sem Causa. A canção foi escrita por Don Henley, Glenn Frey, Jackson Browne e JD Souther para o álbum On the Border de 1974, com a intenção de escrever um álbum sobre anti-heróis. 

A letra da canção contém a frase "too fast to live, too young to die", ou seja, muito rápido para viver, muito jovem para morrer, faz um contraponto com a frase de Dean "viver rápido, morrer jovem". Sobre a canção, que Glen cantou, ele contou ao site The Uncool que: 
Eu sempre achei que a melhor frase do James Dean era 'Minha vida seria bem melhor seu eu pudesse vê-la através das telas' e você não consegue fazer isso. 

Marilyn Monroe - Alarma!! (Manolo Tena)



Marilyn Monroe continua a fascinar décadas depois de sua morte e já teve vários livros e músicas feitas sobre ela. Mas a do cantor Manolo Tena, da então banda Alarma!!, é de uma delicadeza incrível e que merece ser celebrada. 

A canção foi lançada primeiramente pelo grupo de rock Alarma!!, em 1985, e foi composta pelo famoso cantor espanhol Manolo Tena, para o álbum El Lado Obscuro. Ana Bélen relançou a música, em um disco gravado ao vivo, para o Mucho Mas Que Dos, em 1994 com a participação do músico.

A letra fala sobre a solidão da atriz, que buscava o prazer e o amor nas coisas simples e descreve Marilyn com um frase belíssima: "Marilyn nunca contesta, sempre uma pergunta será sua resposta." 

Em entrevista através do chat do site da ABC, ele revelou sobre a canção:
Eu me baseei numa breve biografia sobre Marilyn publicada publicada por um jornal de Madrid num domingo. Então eu li a biografia dela escrita por Donald Spotto. Eu vi os filmes dela inúmeras vezes e escrevi o que via nela. 

Robert Mitchum - Julian Cope

Robert Mitchum é um dos atores da antiga Hollywood mais cool de todos. Com seu jeito de badboy, ele agrada tanto a audiência masculina quanto a feminina (Theresa Wright que o diga!) O músico britânico achava Mitchum tão incrível que ele escreveu uma canção só para ele. 

A música Robert Mitchum faz parte de seu quinto álbum solo, o Skellington, de 1989, mas a canção já havia começado a ser escrita antes, em 1978, ao lado de Ian McCulloch. Com frases como: "Robert Mitchum, eu nunca vi um homem mais digno em minha vida" e "Você é um baita de um cara, sempre meio dormindo", o cantor captura muito bem a essência cool do astro. 

Segundo o cantor ele quis colocar "um verso falso em francês e um solo de assobio" para deixar a canção ainda mais diferente. E conseguiu! 

Ingrid Bergman - Billy Bragg and Wilco

Ingrid Bergman é, sem sombra de dúvidas, uma das atrizes mais talentosas da antiga Hollywood. Com filmes como Casablanca (idem, 1954) e Anastasia (idem, 1955), ela era conhecida por sua beleza peculiar e por dar tudo de si para os seus personagens. 

Ela chamou a atenção do compositor Woody Guthrie, um dos cantores de folk mais influentes dos Estados Unidos, que tinha uma queda tão grande na atriz que escreveu Ingrid Bergman só para ela. Woody nunca cantou a música porque a escreveu nos anos 50, quando já estava consumido pelo alcool e não canta muito, apenas escrevia. Foi sua filha, Nora, que encontrou esse poema e vários outros e sua neta, Anna Canoni revelou ter ficado chocada ao descobrir o poema: 
Ele tinha uma queda enorme na Ingrid Bergman e ele escreveu essa canção maravilhosa sobre ela. É uma canção muito erótica. Só o fato de ele ter escrito uma canção erótica para Ingrid é engraçado para mim.
Depois de Nora ter descoberto o poema, todas as letras feitas pelo seu pai foram lançadas em forma de álbum, póstumo, pelo cantor Billy Brag e a banda Wilco, em 1998 no disco Mermaid Avenue. Na música, Woody menciona o filme controverso Stromboli, no qual Ingrid estrelou e acabou tendo um caso com o casado diretor Roberto Rossellini. Sobre isso, Billy, que introduziu a música na letra de Woody, disse:
Acho que isso fez ele ficar ainda mais obcecado pela Ingrid e fez com que ele tivesse inúmeras fantasias sobre ela. 

The Clash - Right Profile sobre Montgomery Clift

A banda britância de punk The Clash tem como seu maior sucesso a música "Should I Stay or Should I Go", mas eles com certeza também se influenciam e muito pela antiga Hollywood.

Prova disso é a música Right Profile, lançada no álbum London Calling em 1979, escrita sobre o astro do cinema Montgomery Clift. "Right Profile" fala sobre o acidente de Clift, quando o ator, bêbado, sofreu um acidente em 1955 quando saia de uma festa na casa de sua amiga Elizabeth Taylor. A atriz o resgatou, retirando os dentes da sua garganta para que ele pudesse respirar, mas o acidente transfigurou seu rosto e, apesar de cirurgias, ele nunca mais foi o mesmo. 

Sofrendo de depressão, o ator teve como foi conhecido "o suícidio mais longo do cinema." Assim, o The Clash resolveu escrever uma canção sobre Clift e sua vida trágica. O título Right Profile se refere ao fato de Montgomery ser apenas, filmado, então, em sua maioria pelo seu perfil mais bonito, o direito. 

Joe Strummer, vocalista da banda, reconheceu que tinha uma predisposição para depressão, assim como Clift e James Dean, em uma entrevista, revelando: "Eu não quero beber e ficar um cara inchado e morrer no chão. Isso não tem dignidade nenhuma." 

Suzanne Vega - Marlene on The Wall 

Marlene Dietrich é uma das divas do cinema antigo e não tem discussão sobre isso. A atriz alemã teve uma carreira que durou mais de 30 anos, e que sobreviveu à transição do cinema mudo para o falado. 

Por isso, não é surpresa que muitos cantores tenham se arriscado e escrito uma canção sobre Marlene. Uma das mais fascinantes é, com certeza, a Marlene On The Wall da cantora Suzanne Vega. 

Segundo Suzane, que lançou a música para seu álbum homônimo em 1985, ela teve a ideia de escrever a música-tributo depois de ver um filme da atriz passando na televisão:
Foi escrita para a atriz Marlene Dietrich. Essa é a Marlene de quem eu falo na canção. E a primeira vez que a vi foi na televisão. [...] Eu escuto a voz de um homem dizendo 'Você levou muitos homens à ruína com seu corpo'. [...]E a resposta dela, claro, foi a única lógica :' Me dê um beijo'. A partir daí fiquei fascinada por ela, me tornei uma grande fã. Marlene on The Wall, na parede, é por causa de um poster que me deram porque sabiam que eu era uma grande fã dela. 

Roxy Music -2HB sobre Humphrey Bogart

Se Robert Mitchum era o durão mais cool do cinema hollywoodiano, era Humphrey Bogart que sempre interpretava personagens fortes, mas que, no fundo, tinham um coração de ouro. Uma das personalidades mais icônicas do mundo do entretenimento, ele com certeza merece sua própria canção, certo? 

E foi isso que a banda Roxy Music fez ao lançar 2HB, ou seja, 2 Humphrey Bogart, com tradução de Para Humphrey Bogart, no seu álbum homônimo lançado em 1972. A canção foi escrita pelo vocalista Brian Ferry, fazendo uma homenagem ao astro e ao filme Casablanca (idem, 1942)

A letra, que enaltece o sentimentalismo escondido dos personagens de Bogart, mostra como Brian realmente é fascinado pelo ator. Em uma entrevista para o jornal alemão Der Tasspegiel, ele fala mais sobre seu ídolo: 
Ele é um ícone. Assim como Marilyn Monroe, ele se tornou uma persona independente de seus filmes. Quando criança, eu frequentava muito o cinema que era perto de casa. Minha mãe fazia chá para o projecionista, então entrávamos de graça. Eu passei muito tempo no cinema assim como aquele menino de Cinema Paradiso

What Would Katharine Hepburn Say - Christi Haydon

Christi Haydon não era da banda Sparks, formada pelos irmãos Ron Gael e Russell Mael, mas ela fez parte do grupo por um breve período, nos anos 90, quando saiu em turnê com eles como percussionista para o os dois e, inclusive, aparece em alguns videoclipes com eles. 

Em 1993, os três já eram bons amigos, e Christi, que também tinha uma ótima voz, ganhou de presente dos irmãos o single Katharine Hepburn, para cantar com eles durante a turnê. 

Como Sparks era considerada uma banda bem avant-garde, Christi revelou em entrevista que a canção não foi muito bem aceita pelos fãs e as rádios, que não esperavam um hit tão "chiclete" como aquele vindo da banda. 

Nas setlists do show, o nome de Katharine Hepburn é escrito errado, como Katherine. Será que isso quer dizer que os irmãos Mael não são tão fãs da atriz assim? Christi ganhou fama, posteriormente, ao interpretar a personagem Starfleet Ensign na série Jornada nas Estrelas - Nova Geração. 


Nós da Caixa de Sucessos queremos saber: qual é a sua música favorita da lista? 

11 filmes clássicos sobre histórias de amores impossíveis

*alguns spoilers sobre os filmes listados - não diga que não avisamos!

O dia dos namorados no Brasil é comemorado em data diferente do resto do mundo e a explicação é bem simples: por motivos comerciais. O dia original dos namorados, o 14 de fevereiro cai bem na semana da folia que é o Carnaval aqui no Brasil. Mas vale a pena lembrar que o dia 13 é o dia do Santo Antônio, conhecido pela fama de casamenteiro. 


Mas isso não quer dizer que a data do dia 12 de junho não é romântica: ela é a desculpa ideal para presentear a pessoa amada, dizer palavras de carinho e incentivo e o mais importante, mostrar que você se importa. Nesta data tão especial, nós da Caixa de Sucessos listamos onze filmes clássicos com histórias de amores impossíveis - aqueles tão trágicos que a gente não consegue desviar o olhar. 

Queríamos muito ter deixado a lista ainda mais inclusiva, com casais LGBT, mas não existem filmes clássicos que mostrem um relacionamento LGBT de forma direta e sem deixar nas entrelinhas, por causa do vigente Código Hays - damos como dica os filmes Diferente dos Outros (Different from Others, 1919), Brokeback Mountain (idem, 2005), Nunca Fui Santa (But I'm a Cheerleader, 2000), Garotos de Programa (My Own Private Idaho, 1991) e Imagine Eu e Você (Imagine Me And You, 2005) para citar alguns - e nem filmes que mostrem casais negros em destaque sem ser em papeis estereotipados- para isto indicamos filmes como Love Jones (idem, 1997), Além dos Limites (Love and Basketball, 2000), Jason's Lyrics (idem, 1994), Carmen Jones (idem, 1954) e Fire in The Sky (1943). 

Assim, nossa listinha de 11 filmes clássicos com histórias de amores impossíveis foi feita para que você aproveite o dia dos Namorados, seja com aquela pessoa do seu lado ou com você apenas. O importante aqui é seu amor pelo cinema!

Dorothy Dandridge e suas três vindas melancólicas ao Brasil


*Hello! If you want to read this article in english, please roll to the bottom of the page and click on the button number 2! Thank you :) 

Dorothy Dandridge foi a primeira atriz negra a ser indicada ao Oscar de Melhor Atriz por sua interpretação de Carmen, no filme Carmen Jones (idem, 1955), baseado na ópera de Georges Bizet e no livro de Prósper Merimée. Curiosamente, a primeira atriz negra a ganhar o Oscar de Melhor Atriz foi Halle Berry em 2002, que já havia interpretado Dorothy na cinebiografia Introducing Dorothy Dandridge (idem, 1999). 

A estadia de Dorothy Dandridge no Brasil foi a pauta mais votada em nossa enquete para ser a 100ª matéria do site e não é para menos: a atriz era magnífica e sua importância no pioneirismo cinematográfico não deve ser esquecido. Mas antes de 1955 e de Carmen, Dorothy não era muito famosa - renegada à filmes B por conta da cor a da sua pele e pela vigência do código Hays (conjunto de normas morais aplicadas à filmes hollywoodianos de 1930 a 1968) do qual, entre suas inúmeras restrições, também proibia que casais e beijos interraciais aparecessem nas telonas e assim diminuindo e muito as possibilidades da atriz no cinema. 

Assim, quando veio ao Brasil em 1953, Dorothy veio por conta de sua carreira musical - ela fazia muito mais sucesso cantando em shows do que atuando em filmes, sendo considerada a nova Lena Horne pela crítica - e ainda não era a estrela que todos amavam, porém já estava no caminho certo. 

Dorothy Dandridge em sua estadia no Brasil em sua segunda vez                                  Divulgação
Dorothy chegou pela primeira vez ao Brasil no dia 16 de julho de 1953, mas sua chegada era esperada no dia 12, na verdade. A atriz e cantora demorou para chegar porque saiu de Los Angeles no dia 1o de julho, mas acabou parando na cidade de Lima, no Peru porque apenas conseguiria embarcar para o Rio de Janeiro "em garantia" ou seja, se outra pessoa desistisse de seu lugar no voo (naquela época o voo para o Brasil ainda passava por escalas). Assim, ela teve que ficar em Lima, mas conseguiu chegar ao Rio de Janeiro, no aeroporto do Galeão às 10h no dia 16, um dia antes do seu compromisso de cinco semanas de shows no Copacabana Palace. 

Ela foi recebida pelo diretor da publicidade da MGM, sr. Aragão, o dr. Caribé da Rocha, diretor artístico do Copacabana Palace e o sr. Oscar Ornstein, relações públicas do clube, onde ela ficaria hospedada, além de amigos e jornalistas. 

De acordo com o jornal Diário Carioca, a parada em Lima, no Peru, até que não foi tão ruim assim: ela participou de um "show aéreo" realizado por Zizinho e todo o time de futebol Bangu Atlético Clube, e assim já fazendo um "esquenta" antes de chegar em terras brasileiras. A cobertura dos jornais, aliás, com a primeira chegada de Dorothy ao Brasil mostra muito bem que a atriz não era muito conhecida no país - poucos jornais cobriram sua chegada e apenas o Tribuna da Imprensa entrevistou a cantora/intérprete no Rio de Janeiro. 

Foto de Dorothy sendo entrevistada pelo repórter do jornal Tribuna, única foto de  1953                Divulgação
Na entrevista, Dorothy contou um pouco sobre seus prospectos de carreira, especialmente o da profissão de cantora:
Meu último contrato em nightclub foi em St. Louis. Para a minha volta ao Estados Unidos tenho programada uma turnê que inclui Chicago, Reno e outras cidades. Espero voltar a filmar em breve, mas ainda não tenho nenhum filme programado. Gostei muito da oportunidade que Bright Road (1953) me proporcionou de interpretar uma personagem dramática.
Ela revelou também que veio ao Brasil pelo pedido especial do seu amigo Jorge Guinle, de quem era amiga particular, cumprindo apenas a rotina de shows e nada mais.  Seu salário era de 20 mil cruzeiros por dia. 


O jornal A Última Hora ainda revela que o visto de Dandridge foi emitido como de turista e como ela veio ao país para trabalhar, ela quase não conseguiu registrar legalmente o seu contrato com o Copacabana Palace. A Alfândega brasileira, aliás, reteve os vestidos importados de Dorothy, segundo a publicação, e a cantora teve que usar os modelitos criados pela estilista Maria Angélica, na noite de abertura esteve com um vestido branco com uma faixa amarela. A cantora trouxe seu pianista e amigo Morton Jacobs para acompanhá-la com a orquestra. 

Dorothy estreou no Copacabana Palace no dia 22 de julho e foi elogiada por sua voz "belíssima, dicção sonora e clara e elegância de sensibilidade artística" e cantou as seguintes canções: Fine and Dandy, Taking a Chance of Love, Talk Sweet Talk To Me, If This Isn't Love, Blow Out The Candle, What is This Thing Called Love, Our Love is Here to Stay, It Was Just One of Those Things e a música de encerramento, You Got To See Your Baby Everynight. O sucesso foi tanto que logo depois uma gravadora do Rio lançou, ineditamente, os maiores sucessos de Dorothy em disco! 


Propaganda anunciando o show de Dorothy no Brasil em 1953 e seu romance...        Divulgação/Montagem
Como a atriz e cantora tinha apenas um compromisso por noite no Copacabana Palace, participando do conhecido Boite do clube, Dorothy teve tempo de sobra para se divertir na cidade e viver um romance com um conhecido banqueiro paulista chamado Christian Marcos. Os jornais da época não noticiaram muito sobre o romance, apenas uma nota de rodapé, como pode ser visto acima, porém de acordo com o empresário de Dandridge, Earl Mills, o namoro significou muito para a atriz. 

Na biografia Dorothy Dandridge: An Intimate Biography que o empresário escreveu, ele conta mais sobre o caso, inclusive reproduzindo uma das cartas da atriz, contando sobre o romance:
Christian e eu parecemos estar sozinhos nesse paraíso tropical e eu temo ir embora. Ou é evitável? Não poderia deixar minha carreira, casar com ele e viver na América do Sul ou México? - ele possui várias propriedades lá, também. Estou tão aflita mas tão feliz. Eu sou realmente negra, Earl? Ele nunca menciona, me leva para todos os lugares, me apresenta para todos. É um sonho lindo do qual espero nunca acordar. 
Infelizmente, Christian era casado e com filhos, algo que ele nunca havia mencionado antes para Dorothy. A atriz/cantora ficou sabendo antes de terminar seu compromisso de shows no Copacabana, no qual o banqueiro ofereceu uma mesada de 200 mil cruzeiros para que a atriz desistisse da carreira e ficasse com ele como sua amante. Não era isso que Dorothy queria - ela queria casar, ter filhos. Assim, ela deixou um bilhete para Christian que lia-se:
Eu te amo. Eu queria ser sua esposa. Qualquer coisa além disso não funcionaria. 
O show de Dorothy no Copacabana Palace no Rio de Janeiro foi do dia 22 de julho até o dia 11 de agosto de 1953 e já não bastasse todos os contratempos da atriz no país, o Copacabana Palace, um dia antes de sua despedida do Rio de Janeiro, sofreu um incêndio, tudo por causa de uma lâmpada próxima da cortina. O show de despedida de Dorothy, no entanto, aconteceu no Golden Room como programado e logo depois ela partiu para São Paulo, onde fez uma breve visita para participar da boite no Hotel Lord. De lá, a atriz voltou para os Estados Unidos, com um compromisso de shows no clube Mocambo em Hollywood. 

Ainda sobre o romance com Christian Marcos, Earl Mills, empresário da estrela, afirmou que ela ficou profundamente deprimida com o rompimento, com os médicos brasileiros receitando "calmantes que ela consumia como se fossem doces", e assim ela teve que começar a consultar um psicólogo. 


Depois de sua volta aos Estados Unidos, ela continuou atuando em filmes, fazendo shows e conseguiu o papel de uma vida inteira em Carmen Jones (idem, 1954). Uma estrela consagrada, com uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz, Dorothy voltou ao país mais poderosa do que nunca e dessa vez a imprensa brasileira não a esnobou - Dorothy recebeu tratamento de estrela! 

Dorothy Dandridge em sua segunda visita no Brasil em 1955                          Divulgação/Montagem
Dorothy Dandridge chegou ao Brasil mais uma vez no dia 7 de novembro de 1955, pelo aeroporto do Galeão às 1oh15 no avião da Pan American. Desta vez, Dorothy veio ao Rio de Janeiro em caráter beneficente: ela participaria de uma exibição de seu premiado filme Carmen Jones (idem, 1954) em prol da Campanha de Recuperação dos Menores, iniciativa de O Globo e da Rádio Globo. Foi Ibrahim Sued, jornalista de O Globo que lhe fez o convite - do qual Dorothy prontamente aceitou.


Antes da pré-estreia de Carmen Jones no Brasil, no entanto, aconteceu uma coletiva de imprensa entre às 18h e às 22h  no Clube dos Banqueiros. Harry Stone, conhecido como o "embaixador de Hollywood" e representante da United Artists no Brasil, organizou o cocktail,  além de Arthur de Castro, representante da FOX brasileira. A festa também tinha a presença da imprensa brasileira, além de atores como Anselmo Duarte, Cyl Farney, Fada Santoro, Tonia Carrero, Paula Autran, Miro Cerni  e o produtor Fernando de Barros.


Acima com o ator Cyl e abaixo com Harry Stone e Arthur           Divulgação/Montagem
Em entrevista no cocktail, segundo o jornal Diário da Noite, ela revelou estar aflita pois sua mala de cosméticos havia ficado presa em Nova York, por causa do excesso de bagagem, e deixou claro que adora o país e sua estadia de poucos dias não era por escolha própria: "Sinto-me satisfeita de estar no Rio, mas um pouco triste ao mesmo tempo, pois não poderei me demorar aqui mais de dois dias. Compromissos inadiáveis me obrigam a voltar aos Estados Unidos." Mas, é claro, como uma boa performer, ela não deixou de enaltecer o filme que lhe rendeu uma indicação ao Oscar e que lhe trouxe, novamente, ao Brasil. 
O filme é uma beleza. Esforcei-me ao máximo, dando tudo que eu podia, profissionalmente. É um espetáculo que nos oferece grandes sensações humanas. Espero que o público brasileiro acolha esta versão da obra de Bizet da mesma forma que foi acolhida nos Estados Unidos. 
 A atriz também deixou claro o quanto ficou feliz de participar de uma campanha que ajuda as crianças abandonadas, afirmando que: "venho colaborar numa campanha de tão alto valor social e filantrópico, como a da recuperação dos menores abandonados." Sobre seus prospectos no cinema, a atriz revelou que tinha dois filmes em vista: "estudam a possibilidade de eu estrelar uma das duas refilmagens: O Anjo Azul que foi interpretado há tempos por Marlene Dietrich ou Duas Bandeiras de Claudette Colbert." Dorothy nunca estrelou em nenhuma das duas adaptações. 

Dorothy na coletiva de imprensa e ao lado de Cyl e Miro                    Divulgação/Montagem
No dia seguinte, 8 de novembro Dorothy participou da premiére de seu filme Carmen Jones (idem, 1954) no Cine Palácio e foi ovacionada de pé. Logo após a exibição, Dorothy participou de uma festa dada em sua homenagem pelo casal Roberto e Estela Marinho na sua residência de Cosme Velho. 


Dorothy na première de Carmen Jones                                                       Jornal Rio
No dia 9 de novembro, data do aniversário de 33 anos da atriz, ela comemorou a data feliz no Night Room do Copacabana Palace, onde dois anos antes, ela fazia sucesso como cantora da noite. O cantor francês Jean Sabion estava cantando na noite de seu aniversário e o jornal Mundo Ilustrado afirmou que mais uma vez Ibrahim, que organizou o jantar de aniversário de Dandridge, foi quem saudou à saúde da atriz, dizendo entre outras coisas: "À nossa querida Dorothy, que neste instante comemora seu primeiro aniversário..." 


Dorothy apagando as velinhas do seu bolo de aniversário                   Divulgação/Mundo Ilustrado
A atriz foi embora do Rio de Janeiro no dia 10 de novembro, partindo do aeroporto de Galeão para Los Angeles. Com o jornal Revista da Semana, com quem fez uma entrevista final antes de ir embora do país, a atriz/cantora deixou claro como se sentia cansada com sua rotina puxada de artista: " Agora mesmo no Rio, não tive tempo de ver a cidade como desejava. Em Cannes foi a mesma coisa, quatro dias de correria, contatos a cumprir, bailes...sempre ocupada, ocupada, ocupada!" 

A atriz pegou um voo noturno, logo depois de jantar no Hotel Copacabana ao lado do sr. Oscar Ornstein, de quem ela se tornou amiga íntima, que já havia recebido a atriz em sua vinda em 1953. A atriz deu adeus ao Brasil no dia 10 de novembro, mas sua carreira promissora nunca deslanchou verdadeiramente: o preconceito e a incapacidade dos estúdios de não darem papeis mais desafiadores para Dorothy fez com que ela continuasse a lucrar mais em seus shows do que nos filmes em que atuava. 

Para se ter uma ideia, depois de Carmen Jones (idem, 1954), ela atuou em mais sete filmes apenas, tudo em um intervalo curto de sete anos. 


Dorothy preparando-se para voltar aos Estados Unidos - roupa quase idêntica de sua chegada          Divulgação
Deprimida, depois que seu caso com o diretor Otto Preminger, que a dirigiu em Carmen Jones (idem, 1954) e posteriormente em Porgy & Bess (idem, 1939) não deu certo, sendo humilhada por Otto durante as gravações do último filme, Dorothy também acabou perdendo seu momentum em Hollywood por causa de seu jeito controlador do diretor, o papel de Tuptim em O Rei e Eu (The King and I, 1956) que foi para a futura ganhadora do Oscar, Rita Moreno. 

Ela encontrou, posteriormente, amor nos braços de Jack Denison depois do término com Otto, mas era uma ilusão: o empresário abusava verbalmente e fisicamente da atriz e ao finalmente se divorciar dele em 1962, as finanças dela estavam totalmente acabadas e ela teve que abrir um pedido de falência, inclusive tendo que colocar sua filha de necessidades especiais, Harolyn (nascida em 1943) - do primeiro casamento com Harold Nicholas - em uma instituição por estar sem dinheiro.

Foi no meio de toda essa turbulência em sua vida pessoal e profissional, tendo se afastado de seu empresário Earl Mills durante o tempo que ficou casada com Denison, que a atriz retornou ao Brasil para uma série de shows no Rio de Janeiro. 


Dorothy maravilhosa sendo recebida no aeroporto do Galeão em 1960             Divulgação/Montagem
Dorothy chegou ao Rio de Janeiro pelo avião Boeing 707, o primeiro voo sem escalas de Nova York para o Rio, no dia 29 de julho de 1960 às 8h para inaugurar o Grande Prêmio Brasil, a conhecida semana do sweepstake, e se apresentando durante sete dias no Golden Room do Copacabana Palace. A chegada de Dorothy, no entanto, já começou conturbada. 

Recebida pelo empresário Carlos Machado, que patrocinava a temporada da atriz no Copacabana Palace, a atriz foi roubada em mais de 800 dólares, que na época equivaliam à quase 200 mil cruzeiros. A atriz estava acompanhada de sua camareira Vita Cleveland, - e alguns jornais afirmam que sua filha Harolyn também veio, mas parece ser improvável já que Harolyn necessitava de cuidados 24h- enquanto desciam do avião em todo aquele bafafá. A multidão se aglomerou, Vita foi pressionada pela multidão e avisaram-lhe que sua bolsa estava aberta. Então, a surpresa: roubaram todo o dinheiro dela e o de Dorothy, que ela guardava! 

Dandridge não deixou transparecer sua aflição de ter todo o dinheiro roubado, mas fez um apelo aos fotógrafos no local: "Pode ser  que algum tenha registrado, em um golpe de sorte, o momento em que o ladrão agia." Vita foi mais rápida, tratou logo de falar com a Polícia Feminina, que encaminhou o caso para a Polícia Marítima e Aérea, mas o dinheiro de Dorothy nunca foi achado. 

Ainda assim, a atriz/cantora continuou a falar com a imprensa no aeroporto, revelando que ficaria sete dias no Rio de Janeiro e mais sete em São Paulo, que trazia 25 vestidos para suas apresentações e dois maiôs para "se queimar na praia" e que adorava o "café forte brasileiro." Saiu acompanhada de Vita, Harry Stone, Jorge Guinle e de Carlos Machado.


A camareira Vita Cleveland reportando o roubo do dinheiro de Dorothy               Divulgação/Montagem
A atriz estava cansada, não conseguiu dormir durante o voo e o roubo a deixou ainda mais nervosa, sendo que nem compareceu ao jantar organizado em sua homenagem por Ibrahim Sued no restaurante Au Bon Gourmet (alguns jornais afirmam que ela não queria ir, queria passar seus três dias de folga no Rio sossegada e por isso declinou o convite) . No dia seguinte, 30 de julho, com a coletiva de imprensa armada no Hotel Copacabana às 15h, mais um baque: Dorothy, muito atrasada, teve um ataque nervoso e precisou ser retirada às pressas da entrevista.

O jornal O Mundo Ilustrado contou, em detalhes, o que exatamente aconteceu durante a coletiva de imprensa da atriz:
Sem dizer uma palavra, a bela atriz sentou num sofá forçando um sorriso, enquanto os fotógrafos espocavam flashes em todas as direções. Os lábios da estrela, visivelmente trêmulos, apertaram-se e duas lágrimas correram dos olhos. Ante a surpresa geral, a eficiente Vita arrebatou Dorothy do recinto, levando-a de volta para os seus aposentos. 
Dorothy Dandridge sendo resgatada por sua camareira                                           Divulgação
Depois de se recuperar, ela recebeu os jornalistas no seu quarto de hotel, sem os fotógrafos e tratou de se explicar: ainda estava nervosa com o roubo de seu 800 dólares e ao saber que seu grande amigo, Oscar Ornstein, tinha sofrido um ataque cardíaco, a tristeza foi além do que poderia aguentar. Claro que o fato de ter brigado com seu então-marido Devdison sem conseguir acertar as coisas antes de partir dos Estados Unidos, contribuiu e muito para seu estado melancólico, no qual afirmou: 
Afinal, o que pensam que eu sou? O artista não é uma estátua de pedra. Roubam-me todo o meu dinheiro, meu melhor amigo nesta cidade está entre a vida e a morte e ainda assim acham que eu devo sorrir e posar para fotografias como se não sentisse nada?
Ainda na coletiva de imprensa, Dorothy deixou claro que não era nada igual à personagem que inetrpretou em Carmen Jones (idem, 1954), parecendo um tanto irritada com as comparações:
Não sou assim na realidade, embora isso tenha aborrecido muita gente. Sou tímida, sensitiva e extremamente modesta. Visto-me com apuro, buscando sempre a sobriedade. Não uso maquiagem de espécie alguma, passando levemente o batom nos lábios. Os cabelos penteio naturalmente e sou casada, não divorciada como andaram espalhando por aí. 
Dorothy momentos antes de começar a chorar em sua coletiva de imprensa             Divulgação/Montagem
Dorothy também recebeu na coletiva em seu quarto uma pergunta que a aborreceu tremendamente: quando perguntaram se ela preferia o ator Harry Belafonte, que atuou com ela em três filmes, ou Sidney Poitier em Porgy & Bess (idem, 1957). Claramente a atriz era muito sensível sobre qualquer pergunta feita sobre sua raça, ficando na defensiva ao responder: "Não compreendo a razão pela pergunta ou será apenas porque ambos são negros?" 

O domingo de Dorothy ficou ocupado com ensaios para a estreia no Golden Room do Copacabana Palace e no dia da estreia, no dia 1 de agosto de 1960, as críticas foram brutais: jornais reclamaram da performance fraca da atriz e como sua voz não tinha potência o suficiente para preencher o local. Disseram que nas noites posteriores, o desempenho de Dorothy havia melhorado consideravelmente, mas não era nada tão maravilhoso assim. 


Dorothy no dia de estreia, 1 de agosto, no Copacabana Palace           Divulgação
A atriz continuou a se apresentar no Copacabana Palace e inclusive fez uma aparição da TV Tupi, no dia 3 de agosto de 1960 ao lado do apresentador Paulo Monte, mas a atriz/cantora já não era mais a mesma: se na primeira vez no Brasil, em 1953, ela lotou o Golden Room do Copacabana Palace, agora ela não conseguia nem lotar a parte de boate do clube, chamada de Meia Noite, que tinha menos do que 50 lugares. Ficou com fama de difícil assim que recusou-se a atender os fotógrafos na coletiva de imprensa e por não comparecer aos jantares feitos em sua homenagem. 

A imprensa brasileira não fazia ideia que Dorothy Dandridge lutava contra a depressão, misturando pílulas e álcool para aplacar sua dor; eles apenas frisavam o comportamento hostil e nervoso da estrela. Portanto, a sua estreia na TV Tupi, no dia 3 às 21h35 não foi um triunfo para a atriz, ela tentou descontrair, mas estava extremamente triste e desolada. 


Dorothy Dandridge na TV Tupi em 1960                             Divulgação/Revista do Rádio
Um dia depois, Dorothy foi cantar em um evento exclusivo no Country Clube no Rio de Janeiro, em um jantar black tie bem formal e ela continuou com suas apresentações não tão bem-sucedidas no Copacabana Palace, sendo que no sábado participou do Baile de Gala do Sweepstake, no Clube Monte Líbano às 23h, tendo como convidados o governador Sette Câmara e outros atores famosos, mas nem assim brilhou: disseram que a cantora Ângela Maria se deu muito melhor do que ela. Continuou cantando na ala Meia Noite do Copacabana Palace, mas sem grande sucesso de público. 

Para sua participação no show do clube Monte Líbano, Dorothy teria ganhado por volta de 400 mil cruzeiros! 


Dorothy Dandridge no Baile de Gala do Sweepstake e ao lado de seu idealizador Eduardo Farrah
Em entrevista para o jornal Diário de Notícias, ela deixou claro que sua maior paixão era cantar: "Gosto e sinto falta do contato direto com o público, vivo intensamente a reação da plateia, o que para mim, é uma experiência fascinante." Imaginem o quanto ela deve ter ficado desolada com a repulsa do público brasileiro em Copacabana? 


Dorothy belíssima durante o seu show em Copacabana Palace                      Cruzeiro/Montagem
Depois de terminar seu compromisso de shows, no Copacabana Palace no dia 8 de agosto de 1960, Dorothy partiu para São Paulo no dia 9 de agosto, para se apresentar no Cine Marrocos, no centro da cidade, antes das exibições da reprise do filme Carmen Jones (idem, 1954), no qual era estrela. Suas apresentações seriam televisionadas. 

Mas sua estadia em São Paulo, onde ela desembarcou no dia 9 mesmo, no aeroporto de Congonhas, também não começou nada bem - ela tinha uma coletiva de imprensa marcada para o dia de sua chegada no Cine Marrocos, local de sua apresentação, mas segundo o Jornal dos Sports, ela não compareceu alegando estar "afônica." 

O jornal Correio da Manhã alegou que durante sua estadia em São Paulo, a atriz alegava constantemente o cansaço e doença para fugir das recepções dadas em sua homenagem. Apenas compareceu à um compromisso extra-show em São Paulo: uma homenagem que a Associação dos Homens de Cor (Negros, na verdade, mas o jornal na época referia-se a pessoas negras como de "cor") lhe prestou na Vila Prudente, na Zona Leste, porém ficou lá apenas 15 minutos. 


Sobrinha ou filha? Fotos de Dorothy Dandridge em São Paulo em 1960
Dorothy ficou hospedada no Othon Palace Hotel, com sua camareira e uma menina que foi identificada como sobrinha da atriz. A atriz recebeu a imprensa na quinta-feira, dia 11, no saguão do Cine Marrocos e conversou livremente com a imprensa, tendo Carlos Machado como seu tradutor pessoal. 

Durante a coletiva, ela se abriu mais sobre o preconceito racial que enfrentava em Hollywood pelo fato de ser negra, afirmando: "Nos Estados Unidos não existem muitos papeis para mim. Um pouco devido ao meu tipo, um pouco devido à raça. Não acredito que o meu problema seja uma questão de cor pois muitas estrelas se maquiam para ter uma cor como a minha. Deve ser algo mais profundo, a raça. E isso é uma coisa que se posso compreender de modo intelectual, emotivamente me faz sentir muito mal." 

Ela realizou nove shows no Cine Marrocos, começando no dia 11 de agosto de 1960, cada um com 40 minutos cada, e duas exibições na televisão e recebeu mais de 700 mil cruzeiros por sua excursão no Brasil. Conta-se que a atriz/cantora também teve problemas em sua apresentação no Cine Marrocos, por não ter um mestre de cerimônias e assim os tradutores tinham que traduzir o que ela dizia para a plateia e vice-versa. A carreira profissional de Dorothy já não era mais a mesma. 


Dorothy Dandridge no baile de gala no Rio de Janeiro: dando seu melhor, mas a maioria desinteressada...
A atriz foi embora de São Paulo, depois de participar de dois programas de televisão e dois de rádio, no dia 14 de agosto de 1960, para Los Angeles e seu marido, Jack Devidson. O seu contrato foi rescindido antes de cumprir os sete dias em São Paulo na base de 12 mil dólares em vista do pouco sucesso que conseguiu no país. Antes de partir, ocorreram alguns boatos de que participaria de um filme que seria gravado no Brasil com James Mason, Dorothy e o ator Ernie Kovacks, mas isso não se conretizou. A atriz e James, no entanto, atuaram juntos no filme Terror no Mar (The Decks Ran Red, 1958) gravado nos EUA. 

Pode-se afirmar que todas as vindas de Dorothy Dandridge foram melancólicas - não teve uma vez só em que ela pode aproveitar o país e suas belezas. O futuro depois do Brasil também lhe reservava uma dura realidade: perdeu todo seu dinheiro, os papeis já não vinham mais e se afundava cada vez mais em seus vícios. 

Dorothy morreu no dia 8 de setembro de 1965, aos 42 anos de idade. Em uma vida repleta de altos e baixos, suas vindas ao Brasil representam muito bem o clico da estrela: seu início do auge em 1953, o seu pico em 1955 e seu declínio em 1960. Dorothy foi, enfim, uma sobrevivente. 

© all rights reserved
made with by templateszoo